terça-feira, 11 de agosto de 2015

[Resenha] Eu Sou o Mensageiro

Nome: Eu Sou o Mensageiro
Autor: Markus Zusak
Edição: 2/2007
Editora: Intrínseca
Páginas: 320

Sinopse: Ed Kennedy leva uma vida medíocre, sem arroubos. Trabalha, joga cartas com cúmplices do tédio, apaixona-se por uma amiga que dorme com todos os vizinhos do subúrbio e divide apartamento com um cão velho. O pai alcoólatra morreu há pouco; a mãe parece desprezá-lo.

Certo dia, ele impede um assalto a banco e é celebrizado pela mídia. O ato heroico tem consequência. Logo depois, Ed recebe enigmáticas cartas de baralho pelo correio: uma sequência de ases de ouros, paus, espadas, copas, cada qual contendo uma série de endereços ou charadas a serem decifradas. Após certa hesitação, rende-se ao desafio. Misteriosamente levado ao encontro de pessoas em dificuldades, devassa dramas íntimos que podem ser resolvidos por ele. Uma mulher é estuprada diariamente pelo marido, enquanto uma senhora de 82 anos afoga-se em solidão, à espera do companheiro, morto há mais de meio século.

A ele parece caber o papel do eleito, do salvador. Convencido disso, segue instruções e se perde entre ficções de estranhos e sua própria, embaçada, realidade. A certa altura pergunta-se: "Eu sou real?" Markus Zusak cria um personagem comovente capaz de confrontar o mistério e, por meio da solidariedade, empreender um épico que o levará ao centro de sua própria existência.

Comentários:

Não é nenhum segredo que AMenina que Roubava Livros é um título presente no meu TOP 10 Favorite Books, e desde que o li pela primeira vez tenho vontade de conferir outras obras de seu autor. De tantos comentários sobre Eu Sou o Mensageiro vindos de amigos, especialmente da Francielle do Universo Literário, essa me pareceu ser a próxima jornada ideal. Todavia, o livro ficou tanto tempo na minha estante que quando decidi que estava enfim na hora de embarcar nessa já nem lembrava sobre o que se tratava. E fiz questão de começar a ler sem dar aquela conferida na sinopse, há tempos não fazia uma leitura às cegas e já tinha esquecido de qual era a sensação. E é muito bom fazer isso.

De cara já levei um choque por se tratar de uma história contemporânea. Não sei por quê, mas de alguma forma temos a ideia de que os escritores seguem sempre um mesmo gênero. Talvez porque boa parte o faça, e eu que esperava encontrar uma história de época acabei me deparando com uma trama atual. Assim conheci Ed Kennedy, um ordinário (em quase todos os sentidos que essa palavra pode ter) jovem australiano de 19 anos que mente a idade para realizar o ofício de taxista. Sua vida não tem nada de especial, ele não tem nada de especial. Até que ele e seus amigos presenciam um assalto a um banco.

Ed mora em uma casinha simples com seu cachorro Porteiro, joga cartas quase todos os dias com seus três (únicos) melhores amigos Audrey, Marv e Ritchie. Lida quase diariamente com o menosprezo de sua mãe, que faz questão de mencionar o quanto seus irmãos são mais bem sucedidos que ele. Ele mesmo vive se martirizando com o fato que não fez e provavelmente nunca fará nada excepcional. Isso até que o tal banco é assaltado e Ed, contrariando todas as expectativas que tem sobre si próprio, realiza um ato heroico e vira notícia na cidade. E alguém decide que essa não deve ser uma ação isolada, nem mesmo para Ed.

Pouco depois do julgamento do assaltante, Ed começa a receber cartas de baralhos com endereços ou charadas inscritas. Cada uma dessas cartas, os ases de ouros, paus, espadas, copas e um curinga, representam três missões a serem cumpridas, três mensagens a serem entregues. Cabe apenas a Ed descobrir o que essas pessoas passam e o que deve fazer para ajudá-las. Mesmo que seja necessário machucar alguém. Ele começa então sua jornada, sempre se perguntando quem está fazendo isso, por que essas pessoas foram escolhidas e por que ele, Ed Kennedy, foi escolhido para ajudá-las?

A primeira coisa que deve ser dita é que Eu Sou o Mensageiro não é uma história cercada por uma grande moral ou profundas reflexões. Mas sim pela simples constatação sobre ações e resultados. Ao fazer com que Ed - um personagem que está longe de ser um estigma de super-herói - que é a mais perfeita representação da banalidade humana ser forçado a lidar com situações tristes ou simplesmente desconfortáveis para algumas pessoas, ele mesmo se força a descobrir como fazer algo para mudar isso. Pode ser algo simples como passar algumas tardes com uma simpática senhorinha e ajudar uma garota a confiar mais em si mesma, ou intensa como dar uma lição em um marido violento e mostrar a dois irmãos teimosos o que é lealdade. Mostrando como pequenas ações podem ter um valor imensurável, e como sair da zona de conforto – que não significa exatamente uma situação confortável - pode ser difícil.

Outra característica notável é a narrativa feita em primeira pessoa por Ed, que se mostra dono de um humor bastante peculiar e irreverente. Já começa constatando que o assaltante do banco é um mané, e ainda faz várias observações pejorativas sobre si mesmo. Sem falar dos diálogos com Porteiro, é cômico vê-lo imaginando o que o cão lhe diria. (Mas quem nunca fez isso?) E ainda descrevendo seus amigos, que não estão em situação muito melhor e guardam alguns segredos que serão revelados ao longo do enredo.

A trama é dividida em cinco partes, uma para cada carta que Ed recebeu. A capitulação se reveza entre curta e mediana, sendo numerada como as cartas do baralho. Ou seja, vão de A a K em cada parte. Com exceção da última, que é mais curta por trazer apenas uma missão e todos o capítulos recebem a “numeração” J (de Joker). Essa divisão contribuiu para a simbologia da história e deu um toque peculiar a obra, fazendo dela algo realmente único.

A princípio pode parecer que descobrir quem estava mandando as cartas seria uma das coisas mais importantes. Cheguei a criar várias teorias, inclusive, baseada em uma leitura recente, que Ed teria dupla personalidade e ele mesmo as estaria enviando. Bem, a resposta é dada no final mas então você percebe que está longe de ser um dos fatores mais importantes. O que realmente importa são aquelas pequenas percepções, os pequenos atos que podem fazer de nós pessoas melhores. Aquelas coisas que às vezes deixamos de fazer por não julgarmos importante ou fora de nosso alcance, mas quando alguém as realiza por nós faz toda a diferença. E como podemos nos subestimar sem razão alguma.

Eu Sou o Mensageiro pode não ser um livro de grandes eventos e revelações, mas assim como seu protagonista, se faz importante pelas pequenas coisas. Gosto sobretudo de livros que fazem o leitor refletir sem perceber, e esse é um deles. Também uma prova da versatilidade de Markus Zusak. Fico agora ainda mais ansiosa para conferir a Trilogia Irmãos Wolfe.

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